7 de outubro de 2011

Carta a quem teima em remar contra a maré

Ser boa pessoa - ou tentar sê-lo - não te leva a lado nenhum.
E constatar isto, é constatar que nem todas as coisas positivas são valorizadas da mesma forma e, pior ainda, por vezes o positivo é confundido com o negativo.

Não vais ser lembrado porque tentaste ajudar as pessoas sempre que precisavam... 
Dir-te-ão que fizeste tudo isso porque quiseste, e que ninguém te pediu nada. 
Tentarão fazer-te entender que mais valia teres criado objectivos para ti mesmo, sem pensar nos outros, porque, no fundo, é isso que todos fazem.

E a tua palavra vai valer perto de nada, porque provaste que, ao preocupar-te com várias coisas ao mesmo tempo, dispersaste as tuas energias. Devias ter passado mais tempo em ser apenas aquilo que os outros querem que sejas. Devias ter exercido todos os teus direitos e esquecer que os outros também os têm, e deixar de tentar encontrar o equilíbrio.

Desiste de tentar ser diferente. Desiste de tentar agradar ao mundo. 
Porque, no fundo, isso só pode significar que não encontras em ti matéria suficiente para te agradares.
Além disso, já viste que o esforço não compensa. Talvez mereças esforçar-te menos.

6 de outubro de 2011

Permitam-me

Permitam-me que me comova, porque hoje é um dia de perda.
Mais do que um homem, perde-se uma grande mente.
E mais do que uma morte, foi mais um sequestro levado a cabo pelo cancro, esse que leva cada vez mais gente, cada vez mais jovem.
Quando morremos, quase todos nos tornamos "boas pessoas", é um facto. Mas esta pessoa que nos deixou agora, boa ou má, era, sem dúvida, inteligente.
É verdade que não contribuiu em larga escala para o bem da humanidade... mas teve um grande papel em tornar-nos viciados em tecnologia.
E é uma verdadeira imagem de marca, da marca da maçã.
E salvou parte da indústria musical e outras que são alvos de pirataria, com os seus conteúdos a 99 cêntimos.
E era jovem demais para partir, como muitos outros.
Sim, o mundo é muito mais do que a indústria, e muito mais do que tecnologia... mas hoje, todos vivemos dela, e é necessário assumir esse facto. E seria hipócrita dizer que a perda de uma grande mente não é tão importante assim, porque se dedicou a este ou àquele ofício.
Por isso, permitam-me que me comova. Pelo Steve, e por todos aqueles que partem prematuramente.
E pela Apple, que não será a mesma. E por todas as grandes mentes que são desvalorizadas todos os dias.

5 de março de 2011

Senhora de prata

E estava ali, como que pousada, a mulher das tranças de prata.

Estava no mesmo sítio que eu, quem sabe com o mesmo propósito.
Destacava-se pela prata nos seus cabelos que contrastava com a meninice que transpirava.
Não a conhecia de lado algum, nem passei a conhecer nesse dia.
Não a ouvi falar, não sei nada sobre ela.

Mas ficou-me cá dentro; e tinha de a partilhar. Porque tinha tranças de prata, e porque parecia uma menina.
Porque parecia estar ali pousada, e não de pé num canto da rua.
E parecia que ia voar a cada momento, ou espalhar pós de perlimpimpim.

Estivemos no mesmo sítio, à mesma hora, a fazer a mesma coisa.
Mas suspeito que não tínhamos nada em comum.
Não faz mal, senhora de prata; basta-me admirá-la por um momento.

3 de março de 2011

Desaparecida

Há dias, chamaram-me desaparecida. Sem maldade, sem intenções dignas de referência.
Mas eu bem queria ser desaparecida, por vezes. Queria ter um botão que me tornasse invisível e inaudível, para que eu pudesse, pois claro, deixar de ser vista e ouvida.

Porque às vezes só me apetece gritar e disparatar, e denunciar os males do mundo bem alto, para os resolver só de os gritar.
Só que as palavras têm o poder das espadas, por vezes. E eu não estou na disposição de ser a espada que fere o que está estabelecido.
E, quem sabe, talvez seja eu a errada. Mas ainda não vi alguém que pudesse afirmar, com certeza absoluta, o que é certo e errado.

Não sei em que ficamos, se não sabemos o que deveria ser feito para que tudo corresse bem. Gostava que o mundo fosse bom e justo, mas claramente nem todos fomos dotados com bondade e justiça.
E dá-me vontade de desaparecer, porque não consigo ser eu a pôr as peças no sítio. E porque também não consigo viver descansada ao ver que tudo se desmorona a pouco e pouco. A maldade desconcerta-me. a injustiça revolta-me.

E fico assim, porque não consigo resolver nada. E porque frequentemente chego à conclusão de que tentar resolver se torna contra producente.
E de que não compensa tentar ser boa pessoa. Hoje, quero, definitivamente, desaparecer.